Ensaio




Sua voz doce, suave cetim
mergulhos, tristezas, frustrações
sonhos de menina, desejos de mulher
mente adolescente, cansaço de mãe
Amor impossível entre pausas
eram suas canções.

A poesia do Mato


Uma didática da invenção

IV
No Tratado das Grandezas do Ínfimo estava
escrito:
Poesia é quando a tarde está competente para
dálias.
É quando
Ao lado de um pardal o dia dorme antes.
Quando o homem faz sua primeira lagartixa.
É quando um trevo assume a noite
E um sapo engole as auroras.

(Manoel de Barros. O livro das ignorãças)


A canção que se segue é uma interpretação minha da música Cunhataiporã, do músico sul-matogrossense Geraldo Espíndola. Fiz esta gravação porque não encontro esta música em lugar algum, mas garanto, é bela. Usem da imaginação, eu fico imaginado-a na voz de um Zeca Baleiro ou Oswaldo Montenegro... (rsrs)

Um texto despretencioso qualquer.


Falo da minha mania de correr riscos. Quando tudo vai muito bem, vou lá, não resisto, procuro uma desordem e mostro absurdos, os meus ou seja lá de quem for. Vai ver que é porque não gosto de gente certinha, sem erros, programadas a não sofrer ou a não viver suas verdades. Incomoda-me namorada perfeita ou boazinha demais. Incomoda-me emprego quadrado. Sabe esses gordinhos com terno, gravata, óculos e um sorriso besta na cara? Gosto mesmo é da tensão. Foi assim, aos 19 anos, eu e meu colega Isaías, vistos como os bonzinhos da turma resolvemos falar o que pensávamos e agir como pensávamos. Foi o caos. Em menos de três meses o folgado do presidente antigo do C.A teve que tirar sua imbecilidade reacionária e reconstruímos o caos necessário, conflito entre estudantes e um corpo corrupto de professores, que mais tarde, dois dentre eles, saíram estampados em fotos de jornais. É disso que eu gosto. Da tensão. Foi assim que pronunciei-me a favor da discriminação positiva e atirei pedra no vidro. Um foda-se acadêmico juvenil. Durante três anos estivemos lá e apoiávamos qualquer causa que apontasse uma pessoa ferida e uma injustiça. Da restituição de taxas indevidas a denúncia de corrupção no repasse de verbas. Até a menina que dava pro professor e ganhava alguns bônus entrou na dança. Foi demais! Foi assim também que um caça as bruxas foi instaurado e muitos perderam suas bolsas de estudo. Não diferente pra mim. Mas era êxtase puro, estar numa reunião, ver a cara vermelha daquele professor arrogante querendo nos derrubar e não conseguir, dias de glória. Foi um dos momentos mais emocionantes da minha vida quando li o relatório dos estudantes na avaliação daquele careca, lembro até hoje da frase final, aprovamos a renovação do professor X com fortes recomendações e ressalvas... Nunca ri tanto por dentro. Foi nessa coisa minha que fiz aquela proposta e me diverti com elas, era um desejo de meses e consegui, inacreditável. Tudo isso eu, homem de modo tímido e jeito calmo. Tenho vergonha, mas tem hora que é incontrolável.

Ao som da Rapsódia Hungara N. 02 - Franz Liszt






Rapsódia em movimento - O convite


Tímida, você? Olho em teus lábios, boca
face cor de maçã, sorriso espontâneo
Aceite, é só um movimento, venha cá
isso, sem pressa, pode rir, ode a alegria

Não se preocupe, isto, está indo bem
vê como não é difícil? Sim, as crianças
elas também dançam, todos aqui
pronto, estamos em sintonia.

Vejo teus olhos fechados, silêncio
estamos só nós dois, sinto teu pulsar
teu coração soa leve, silencia em noturnos
logo se alegra, começa a acelerar, festivo

O movimento é o mesmo, a dança é ímpar
O coração é que muda de intensidade
parece outro tema, minueto, renovemos
nosso amor ao som da inspiração

Sorrimos, já estamos íntimos, somos um
scherzo bailando a canção de circo
já não importa qual é a variação
o movimento se repete, o amor se constrói

Até a sonata infantil nos aproxima
E o salão é nosso, não importa
todos os amantes pensam o mesmo
tudo ao redor é só figuração musical

MEMÓRIAS INACABÁVEIS


Escrito aos 13 anos na sétima série.
Publicado sem correção, os títulos são originais também.
Provavelmente estava ouvindo Black Sabbath e Raul Seixas.

REFLEXÕES SOBRE... O AMANHÃ

Mas será que haverá um amanhã? Não me responda com tanta convicção, apenas reflita. Não tenha medo de se perder, deixe-se guiar entre suas emoções e seu raciocínio, entre o real e o abstrato, entre a loucura e a lucidez, algo entre o nada e a vida. Mas não se envolva muito pois poderá ficar louco como eu, que escrevo isto lúcido mas não o suficiente para não ser discriminado pela sociedade que considera meus pensamentos nada mais que meros suspiros da mente de um ser incontrolado e dominado pela loucura. Mas não me considero um louco, pois se sou o tal, existem muitas pessoas loucas no mundo como eu, mas que não compartilham essa loucura, querem ser "lúcidos", mas não são felizes como nós os loucos que sabem o prazer de viajar pelo desconhecido. Me sinto lúcido em minha mais saudável loucura.

A FELICIDADE - PARTE II

O ódio me faz refletir, momentos infelizes são a minha aurora do viver, me sinto feliz em minha súbita infelicidade, já não sinto mais prazer nas coisas saudáveis da vida, apenas naquilo em que possa refletir. Adoro as pessoas que contrariam meus ideais, pois assim posso pensar um pouco mais e assim expandir meus horizontes juvenis. Tudo isso não faz lógica para aqueles meros egoístas que se julgam normais. As pessoas, na maioria das vezes, tentam evitar que me magoem ou me aborreçam, mas não sabem que é exatamente o que não quero.

Musicando Poemas...




Estas são as músicas que fiz de alguns poemas meus... Assim, meio que de brincadeira, rs.
Abs!
Leandro

Recordação


...sea... by ~frida-vl on deviantART

Pela noite.
Ó morena do mar,
Trago, consumo,
desejo em palavras
fortes ventos de esperança,
em noturna viagem, descanse.
Longa jornada,
és navegante
sob sopros do divino,
Que o sol lhe apresente o céu mais limpo...

Olhai as aves do céu,
Com sabedoria e buscas,
Descanse ao meio dia,
Sinta a vida, a consumir,
construir, fortalecer...

E o mar, está, existe, assim:
como versos confusos, por vezes
em decassílabos, em tempestades,
por vezes, monossílabos, em
Paz...

E faça festa
Então, se quiser,
Lance-se ao mar,
esqueça os mapas,
Saiba, haverá calmaria,
A mão que te guia a abraçará,
O infinito que a possui por graça
aqueça-lhe num sem-fim de alegria,
sorrisos, como versos em poemas,
que parecem não ter começo, nem fim...

Na voz de um cantador



1981
Atentado à segundo.
Triste mulher do lado.
Rei Diamante.
Se foi o chofer da praça.
Cinema novo em luto.
Projeto Brainstorm também.
Cortado. Nasci de assim.
E teve mais.

Uma canção e uma frase




Just in time
(Nina Simone)

Let's go

Just in time you found me just in time
Before you came my time was running low
I was lost them losing dice were tossed
My bridges all were crossed nowhere to go
Now you're here now I know just where I'm going
No more doubt or fear I've found my way
Your love came just in time you found me just in time
And changed my lonely nights that lucky day

Just in time

Before you came my time was running low oh baby
I was lost them losing dice were tossed
My bridges all were crossed nowhere to go
Now you're here now I know just where I'm going
No more doubt or fear I've found my way
Your love came just in time you've found me just in time
And changed my lonely nights and changed my lonely nights
And changed my lonely nights and changed my lonely nights
And changed my lonely nights that lucky day


Cachimbos e charutos são companheiros. Eu os defendo, estão em todo lugar. Existencialistas, pintores, libertários, téologos, velhos, umbandistas, burgueses. Não precisa se deparar com algum Mueller sentado na varanda fazendo fumaça pra conhecer este mistério. Eu não entendo nada de literatura, nem de pintura, muito menos de burgueses, mas sei que há esta corrente. Não consigo negar a magia que há no preto velho sentado ao lado de um atabaque. Assim como não consigo negar a magia que há naquele quadro de Van Gogh. Aliás, daquela cadeira quantos personagens poderiam percorrer, Bultmann leitor de Heidegger, Pai Alcir devoto de Assis, apresentador de TV, comunista assassinado, professor frustado. Enfim, tanto há e tudo pode se fundir numa fumaça, por que não?

Ele esteve ao encontro da mais antiga mãe de santo da cidade. Ela, senhora de idade, trocou algumas palavras com o jovem rapaz. Este, ávido pelo conhecimento não hesitou, sentou ao seu lado, falou de sua vida, de seu modo de ver o mundo. Ela falou-lhe de sua fé, contou sábias histórias, gente que passou, que ela ajudou e amou. Depois de um bom papo a dois, já eram íntimos. Ele, aspirante a inspirador de sonhos, ela, feiticera de mágicas e danças. Foram para o ato mais sincero e puro de devoção. Ela fez sua petição mágica e ele orou o Pai Nosso. Num plano espiritual eles dialogaram, cada um em sua condição religiosa existencial, trocaram desejos bons a seu Deus, e se despediram em paz. Ambos, amantes das fumaças.



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Eu não te amo mais.
Dou-lhe minhas costas e paz.
Fica melhor compor assim.
E não engasgue, por favor.
A você, infortúnio de dias
sem calma, fique aí, eu
te desprezo, com toda minha angústia
eu te abandono.
objeto de depósito de dores amargas
frias e insanas.
Fica com teu orgulho,
consuma-se em velório e solidão.
Podem até virem te buscar
Não encontrarão, não me ouvem.
É preciso gritar?
Eu não te quero mais!

Avientame - Cafe Tacuba



Desejos vãos
(Florbela Espanca - Livro de Mágoas)

Eu queria ser o Mar de altivo porte
Que ri e canta, a vastidão imensa!
Eu queria ser a Pedra que não pensa,
A pedra do caminho, rude e forte!

Eu queria ser o Sol, a luz intensa,
O bem do que é humilde e não tem sorte!
Eu queria ser a árvore tosca e densa
Que ri do mundo vão e até da morte!

Mas o Mar também chora de tristeza…
As árvores também, como quem reza,
Abrem, aos Céus, os braços, como um crente!

E o Sol altivo e forte, ao fim de um dia,
Tem lágrimas de sangue na agonia!
E as Pedras… essas… pisa-as toda a gente!…

Blues Before Sunrise



Kath Bloom - Come Here


Desilusão de um sonho.*

Limosine e os cílios
Ah, querida, com seu lindo rosto
Derrame uma lágrima no meu copo de vinho
Vendo seus grandes olhos
Percebo o que você significa para mim
Bolos ou milkshakes
Sou um anjo desiludido
Sou um desfile de fantasia
Quero que saiba o que penso
Não quero mais que adivinhe
Você não faz idéia de onde vim
Não sabemos para onde estamos indo
Jogados na vida
Como ramificações de um rio
Correndo rio abaixo
Pescados pelo presente
Te levarei. Me levarará
É como deve ser
Você não me conhece
Não me conhece até agora.

*Poeta andarilho em Before Sunrise(1995)

Devocional



A Oração de São Francisco é uma damais belas devoções. Quando vi estava orando. Foi minha oração, no meio da madrugada, e me trouxe paz. "Compreender que ser compreendido", penso que esta deva ser a máxima para um diálogo puro e verdadeiro. Olhar pelo outro.


Desespero

Castro Alves

"Crime! Pois será crime se a jibóia

Morde silvando a planta, que a esmagara?

Pois será crime se o jaguar nos dentes

Quebra do índio a pérfida taquara?

"E nós que somos, pois? Homens? — Loucura!

Família, leis e Deus lhes coube em sorte.

A família no lar, a lei no mundo...

E os anjos do Senhor depois da morte.

"Três leitos, que sucedem-se macios,

Onde rolam na santa ociosidade...

O pai o embala... a lei o acaricia...

O padre lhe abre a porta à eternidade.

"Sim! Nós somos reptis... Qu'importa a espécie?

— A lesma é vil, — o cascavel é bravo.

E vens falar de crimes ao cativo?

Então não sabes o que é ser escravo!...

"Ser escravo — é nascer no alcoice escuro

Dos seios infamados da vendida...

— Filho da perdição no berço impuro

Sem leite para a boca ressequida...

"É mais tarde, nas sombras do futuro,

Não descobrir estrela foragida...

É ver — viajante morto de cansaço —

A terra — sem amor!... sem Deus — o espaço!

"Ser escravo — é, dos homens repelido,

Ser também repelido pela fera;

Sendo dos dois irmãos pasto querido,

Que o tigre come e o homem dilacera...

— É do lodo no lodo sacudido

Ver que aqui ou além nada o espera,

Que em cada leito novo há mancha nova...

No berço... após no toro... após na cova!...

"Crime! Quem falou, pobre Maria,

Desta palavra estúpida?... Descansa!

Foram eles talvez?!... É zombaria...

Escarnecem de ti, pobre criança!

Pois não vês que morremos todo dia,

Debaixo do chicote, que não cansa?

Enquanto do assassino a fronte calma

Não revela um remorso de sua alma?

"Não! Tudo isto é mentira! O que é verdade

É que os infames tudo me roubaram...

Esperança, trabalho, liberdade

Entreguei-lhes em vão... não se fartaram.

Quiseram mais... Fatal voracidade!

Nos dentes meu amor espedaçaram...

Maria! Última estrela de minh'alma!

O que é feito de ti, virgem sem palma?

"Pomba — em teu ninho as serpes te morderam.

Folha — rolaste no paul sombrio.

Palmeira — as ventanias te romperam.

Corça — afogaram-te as caudais do rio.

Pobre flor — no teu cálice beberam,

Deixando-o depois triste e vazio...

— E tu, irmã! e mãe! e amante minha!

Queres que eu guarde a faca na bainha!

"Ó minha mãe! ó mártir africana,

Que morreste de dor no cativeiro!

Ai! sem quebrar aquela jura insana,

Que jurei no teu leito derradeiro,

No sangue desta raça ímpia, tirana

Teu filho vai vingar um povo inteiro!...

Vamos, Maria! Cumpra-se o destino...

Dize! dize-me o nome do assassino!..."

_________________

"Virgem das Dores,

Vem dar-me alento,

Neste momento

De agro sofrer!

Para ocultar-lhe

Busquei a morte...

Mas vence a sorte,

Deve assim ser.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

"Pois que seja! Debalde pedi-te,

Ai! debalde a teus pés me rojei...

Porém antes escuta esta história...

Depois dela... O seu nome direi!"

Depois da estação.

Foi lá, depois da estação de trem. Como num quadro pintado por um ambulante. Com um cotidiano qualquer, atravessou. Entre crianças chorando no chão e um velho pitando seu molhado paiêro, avistou. Não eram prodígios, nem se tratava de um Souza Paiol. Ela se foi.
As palavras sufocaram-lhe por um tempo. Engasgado com a resignação de uma conquista perdida por rotas distintas. E pensou consigo mesmo, a praça Santos Dumont não pode ser obra do acaso. Foi bem ali que Bia conheceu seu amor e não poderia ser em outro lugar.
Onde estaria guarda José senão na praça ferroviária? E continuou a passos largos, com uma sensação de alívio. Já que amores ocorrem em lugares quaisquer, por que não naquele postal quase antigo? Vive de novo! Em paz.*

A estação original em 1919.

A segunda estação em 1922.
A estação, foto sem data.**

*Baseado em fatos reais, os nomes são fictícios.
**Fotos retiradas de http://www.estacoesferroviarias.com.br/ms_nob/tres.htm




Sobre exílios e ilusões

É como se o compositor ao sentar em frente de seu piano, respirasse a pureza do incenso de olíbano e olhando a um quadro de Rembrandt sentisse paz em La menor, num pianíssimo breve de calma, carinho e amor...

E é um só sentimento...

Há imagens e poemas que se casam com canções. Pode ser que o músico, o poeta, o pintor, o discípulo estejam sob a mesma condição... Talvez, o que importa seja abrir o peito. Seria isto a arte? Abrir o peito?
O artista sabe que arte não é ilusão. Ele aprende o exercício de tirar suas máscaras e abre a si mesmo no objetivo de ouvir sua mais secreta voz. E isso não se faz com displicência e indiferença.
Artista é aquele, doa-se à arte e ao sofrido exercício de encontrar sua verdade, seja ela a paz, a dor, o amor ou a busca pelo infinito... O artista sabe que seu despejo, mesmo que mal interpretado, sempre levará sua verdade, pureza, por isso valerá a pena. Em nosso exílio eterno, agem como verdadeiros anunciadores. E por momentos, deixamos de não sermos a nós. Encontramo-nos.
Ao receber a eucaristia, o discípulo executa a mesma busca que faz o poeta e o cantor, transforma-se n'outro e vê quem é (era).

A verdade e a liberdade estão em nossas buscas...

Desconstrução

O Quereres

Caetano Veloso

Onde queres revólver, sou coqueiro;
Onde queres dinheiro, sou paixão!

Onde queres descanso, sou desejo;
E onde sou só desejo, queres não!

E onde não queres nada, nada falta;
E onde voas bem alto, eu sou o chão;

E onde pisas no chão,
Minha alma salta: e ganha liberdade na amplidão...

Onde queres família, sou maluco;
E onde queres romântico, burguês!

Onde queres leblon, sou pernambuco;
E onde queres eunuco, garanhão!

E onde queres o sim e o não, talvez;
Onde vês, eu não vislumbro razão!

Onde queres o lobo, eu sou o irmão;
E onde queres cowboy, eu sou chinês!

Ah, bruta flor do querer...
Ah, bruta flor, bruta flor!

Onde queres o ato, eu sou o espírito;
E onde queres ternura, eu sou tesão!

Onde queres o livre, decassílabo;
E onde buscas o anjo, eu sou mulher!

Onde queres prazer, sou o que dói;
E onde queres tortura, mansidão!

Onde queres o lar, revolução;
E onde queres bandido, eu sou o herói!

Eu queria querer-te amar o amor,
Construírmos dulcíssima prisão;

E encontrar a mais justa adequação:
Tudo métrica e rima e nunca dor!

Mas a vida é real e é de viés,
E vê só que cilada o amor me armou:

Eu te quero e não me queres como sou;
Não te quero e não me queres como és...

Ah, bruta flor do querer...
Ah, bruta flor, bruta flor!

Onde queres comício, flipper vídeo;
E onde queres romance, rock'n roll!

Onde queres a lua, eu sou o sol;
Onde a pura-natura, o inseticídeo!

E onde queres mistério, eu sou a luz;
Onde queres um canto, o mundo inteiro!

Onde queres quaresma, fevereiro;
E onde queres coqueiro, eu sou obus!

O quereres e o estares sempre a fim,
Do que em mim é em ti tão desigual...

Faz-me querer-te bem;
Querer-te mal:

Bem a ti, mal ao quereres assim:

Infinitivamente impessoal;
E eu querendo querer-te sem ter fim!

E querendo-te,
Aprender o total...

Do querer que há;
E do que não há em mim!

Essa música-poesia me veio como um espelho. No momento, desconstruo-me. Portanto, se estiver assim, tão estranho, tão só, seco e calado, tão dor é porque a vida é real e de viés, fui pego na surpresa, ainda estou sem reação.

PS: conscientizei-me de que ainda há uma Travessia a se cumprir: como elaborar uma práxis que se enquadre na luta contra a aberração que se estabeleceu como meta em muitos cotidianos, a miséria na fartura?

PS²: Não, não fui coerente.

Arreeeeeeeeéguaaaaaaaa!!!

Timidez


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O que eu vou dizer, você nunca ouviu de mim
Pois minha timidez não me deixou falar por muito tempo
Para mim você é a luz que revela os poemas que fiz
Quem conhece da terra e do sol
Muito sabe os mistérios do mar

O que eu vou dizer, você nunca ouviu de mim
Pois quieto que sou só sabia sangrar, sangrar cantando
Quantas vezes eu quis me abrir
E beijar e abraçar com paixão
Mas as palavras que devia usar fugiam de mim
Recolhidas na minha prisão

O que eu vou dizer, você nunca ouviu de mim
Pois minha solidão foi não falar, mostrar vivendo.
Quantas vezes eu quis me abrir
e as portas do meu coração sempre pediam
Seu amor é meu sol
E sem ele eu não saberia vive

Milton Nascimento e Fernando Brant


Mulheres, quero ouvi-las... Depois a gente conversa.


Deus e seus atributos femininos
Marcella Bastos

Quando se fala de Deus, geralmente sua imagem está ligada à figura masculina. Atributos femininos, no entanto, podem ser encontrados na pessoa Dele. É o que afirma a Teologia Feminista, que se propõe a estudar a Bíblia do ponto de vista feminino e evitar que as pessoas enxerguem apenas as características masculinas de Deus.

Uma das preocupações dessa vertente da Teologia é a imagem do Criador e a presença dessa imagem em cada pessoa. Porque como Deus é interpretado como homem, o gênero masculino parece se sobrepor ao feminino. “Deus está acima da condição sexual. Ele é a causa de tudo, por isso, não é nem homem nem mulher e sim a junção dos dois”, disse a professora da cadeira de Teologia da Mulher da Escola Superior de Teologia (EST), Elaine Neuenfeldt.

A Teologia Feminista chama a atenção para o direito da mulher à expressão e realização. Isso deve acontecer não por mera concessão da parte do homem, mas pelo respeito para com a dignidade dela, representada por suas características peculiares (físicas e psicológicas), além de seus ideais, preferências e opiniões.

Segundo Elaine, que também é pastora da Igreja de Confissão Luterana em Porto Alegre (RS), a mulher sempre esteve presente nas passagens bíblicas, desenvolvendo um importante papel na história da salvação. Muitas foram protagonistas, como Sara, Rute, Débora e Ester, mas outras, apesar de anônimas, fizeram parte da vida dos apóstolos e foram decisivas para que o Evangelho fosse disseminado em todo o mundo.

ORIGENS DO FEMINISMO CRISTÃO

No fim do século passado, um grupo de mulheres cristãs norte-americanas, lideradas por Elizabeth Cady Staton, começou a se reunir periodicamente para estudar todas as passagens bíblicas onde havia referência à mulher. O objetivo era fazer uma releitura e interpretá-las à luz da nova consciência que a mulher tinha de si mesma.

Nesses encontros nasceu a Woman’s Bible (Bíblia da Mulher), editada em duas partes, respectivamente em 1895 e 1898, uma obra que abalou o mundo protestante americano. A realização desse vasto projeto de revisão e re-interpretação da Bíblia feita por mulheres foi o primeiro sinal marcante de um novo pensamento feminino, que amadureceu também no interior de comunidades cristãs.

A idealização da Bíblia da Mulher foi considerada como fato tanto cultural, como eclesial. Foi também um ponto de partida de um longo processo, que por volta dos anos 60 levou à elaboração do projeto de uma Teologia Feminista.

Outro momento importante aconteceu no período entre 1956 e 1965, quando as principais correntes do protestantismo decidiram admitir as mulheres no pastorado nos Estados Unidos. Esse fato representou uma grande novidade eclesiológica nestas comunidades, com exceção das igrejas livres americanas, que já praticavam a ordenação de mulheres desde 1853.

TEOLOGIA FEMINISTA x TOLOGIA DA MULHER

Teologia Feminista e Teologia da Mulher não são a mesma coisa. A primeira critica a segunda por causa de sua unilateralidade e de seu androcentrismo (pensamento centrado em si mesmo). Para Elaine, Teologia da Mulher perpetua estereótipos que a Teologia Feminista procura demolir. Por exemplo, uma “teologia da mulher” exigiria como contrapartida a elaboração de uma “teologia do homem”, ao passo que a feminista se auto-compreende como uma contribuição crítica para uma “teologia da integralidade”, que lida com os gêneros da mesma forma e importância.

Sendo assim, a Teologia Feminista é pela libertação das mulheres. É uma reflexão elaborada e praticada por elas e que busca tirá-las das sombras para colocá-las no mesmo patamar dos homens. “Pela primeira vez, concretamente, as mulheres se tornaram sujeito de sua própria experiência de fé, de sua formulação e da relativa reflexão, e por isso, aptas a construir teologia”, afirmou o pastor Edson Fernandes, da Igreja Cristã de Ipanema, zona sul do Rio de Janeiro, que também é professor do Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil.

Através dessa nova forma de estudar a Bíblia, as mulheres são capazes de refletir sobre suas experiências humana e cristã, e olharem para si mesmas com um olhar crítico. Desse modo, a Teologia Feminista introduz no círculo hermenêutico (o círculo que liga a experiência do passado, utilizando textos bíblicos e a tradição à experiência atual da mulher) a participação feminina, enriquecendo a fé, a sua formulação e as suas expressões.

A Teologia Feminista não quer ser unilateral, mas deseja reagir com eficácia à falta de imparcialidade da teologia dominante e prática eclesial. Sobre esse equilíbrio entre homens e mulheres, o pastor Glauner Pereira, que é professor do Seminário Teológico Batista Gonçalense, ressaltou o seguinte: “Quando a Teologia Feminista se dispõe a ceder seu lugar a uma equilibrada, justa, saudável e romântica Teologia dos sexos ou dos gêneros, que não subtraia nada do valor e direitos da mulher, ela mostra-se sábia. Se, por outro lado, ela fizer questão de se manter como um corpo autônomo, tão insensível como a insensibilidade que veio questionar, prestará um desserviço à Igreja de Cristo. A Teologia Feminista surgiu como antídoto a um problema, devendo se guardar de torna-se, ela mesma, outro problema”.

Os teólogos consultados por Enfoque foram unânimes ao afirmar que qualquer perspectiva que pretenda propor-se como luta dos sexos não passa de uma ilusão e perigo. Desembocaria em situações de segregação e de competição entre homens e mulheres e promoveria um solipsismo, ou seja, um isolamento, que se nutre de uma falsa concepção de liberdade.

INTERPRETAÇÃO NÃO PARTIDÁRIA DA BÍBLIA

A Bíblia ensina a submissão da mulher ao homem, e durante muito tempo as igrejas interpretaram esse ensino como sendo desfavorável ao sexo feminino. Alguns estudiosos apontam que as Escrituras foram usadas como arma política contra a emancipação da mulher, para que ela fosse reprimida e renegada ao segundo plano.


Elaine afirmou que Deus não é homem, tão pouco mulher. A pastora e teóloga ressaltou que o Criador está acima da condição sexual

Para a bispa Marisa Coutinho, da Igreja Metodista do Brasil, a atual imagem da mulher está contaminada pelo pecado. “No hebraico, a palavra idônea significa completa, inteira, ou seja, a mulher foi criada por Deus para andar ao lado do homem de forma completa”, disse, ressaltando que tanto homens quanto mulheres são iguais diante do Criador.

A hermenêutica bíblica feminista se propõe a mudar a má interpretação dos textos sagrados, além transformar o que os teólogos apontam como um problema cultural de poderes entre os sexos. Para isso, são usadas análises e temas de reflexão com uma linguagem e um imaginário elaborados na perspectiva da mulher. Dessa forma, são acionadas a sua capacidade de integração, seu senso de comunidade, sua proximidade com a natureza, servindo para superar distorções patriarcais e para reconstituir um elo de igualdade.

“Não existe nenhum texto bíblico em que Jesus impeça as mulheres de se aproximarem Dele. Ele se relaciona com elas e as inclui como co-participantes de seu ministério”, afirmou Elaine. A pastora também ressaltou que o parâmetro dos cristãos é Cristo e que, portanto, é necessário seguir essa prática para que a mulher seja livre para exercer o seu ministério sem preconceitos e fundamentalismos patriarcais.

Um exemplo prático disso é o uso da chamada Linguagem Inclusiva, que não usa o gênero masculino como universal. Antes, procura a designação geral que abranja o homem e a mulher. Por exemplo, ao invés de dizer “irmãos”, masculino plural, para aludir a ambos os sexos, usa-se “irmãos e irmãs”.


DEUS E O AMOR DE MÃE

Outra mudança é a constatação dos atributos “femininos” de Deus. Segundo Elaine, na Bíblia, o amor divino é comparado ao amor de mãe e não ao de pai. Em Lucas 15, versículo 8, Deus é representado como a mulher que varre a sua casa e encontra a dracma perdida. “A figura masculina de Deus está ligada à ordem e à lei, mas quando é necessário apontar seu amor, a imagem usada é a da mãe, que representa amor, carinho e acolhimento”, constatou o pastor Edson Fernandes.

Mulheres são protagonistas e co-participantes da proposta do reino de Deus. Ele criou homem e mulher para que juntos governassem a terra. A Teologia Feminista deve servir para mostrar que a mulher não é objeto em sua relação com o homem, mas comprovar que os dois são co-sujeitos dos projetos divinos.

CONTRIBUIÇÃO FEMININA NA BÍBLIA
Ariane Azeredo

Durante toda a Bíblia, diversas mulheres foram usadas por Deus para cumprir seus propósitos. Umas, santas e recatadas, como Maria (Mateus 1:18), mãe de Jesus, Izabel (Lucas 1:5), mãe de João Batista, e ainda Ana (I Samuel 1:2), mãe do profeta Samuel. Outras, excluídas da sociedade, como Raabe (Josué 2:1), a prostituta que ajudou os espias na terra de Jericó e que entrou na genealogia de Jesus, e Maria Madalena (Mateus 28:1), ex-prostituta, que foi, ao lado de outra mulher, a primeira pessoa a ver Cristo ressurreto.

Algumas foram protagonistas de cenas repletas de ternura e amor de Cristo, apresentando a força da mulher e a sua capacidade de transformação e de determinação, como a adúltera (João 8), a samaritana (João 4), a mulher com fluxo de sangue (Marcos 5:25), a viúva de Naim (Lucas 7:11), a sogra de Pedro (Lucas 4:38) e tantas outras anônimas.
Um simbolismo que não pode passar despercebido é que Cristo chama a igreja de noiva, uma mulher, que devia estar preparada, devidamente ataviada e adornada para encontrar-se com seu noivo. Mais uma vez, a beleza, a delicadeza e a sensibilidade da mulher são exaltadas na Bíblia, não como um ser abaixo do homem, mas como alguém que tem características únicas e contribuições ímpares para a realização da vontade de Deus na terra.

http://www.revistaenfoque.com.br/index.php?edicao=58&materia=403

Alguns artigos interessantes:
www.lstc.edu/lifelong_learn/06summersession/Garcia_Bachmann_biblio-rev1.doc
http://www.abiblia.org/artigosview.asp?id=80
http://www.ecaminos.cu/leer.php/3842
http://ibict.metodista.br/tedeSimplificado/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=291

Isto não é sério não, tá?

Quanto sono, quanto de mim ja ficou por lá. Em quantos já fiz bem? Arrependo-me de não ter sido tanto. Sou pouco, fraco, pobre, cansado. Vou deitar, memorar, tentar sonhar bem, descansar. Tenho muito a fazer, a construir, ajudar, destruir. Sou chato, cheio de manias, canto na hora errada e acordo cedo demais. incomodo. não to nem aí pra essas acentuações. às vezes accho isso tão besta, accho com dois cês é tão mais bonito pra se ler, só pra ler é claro. acho bonito um texto sem letras maiúsculas... Isso é parte de mim. Mais um dia daqueles de bolo, guaraná, amigos, quase amigos, desamigos, abraços e falsos. mas sou esse aí. Sentado na poltrona, adoro a madrugada, pc, TV e livro. Isso é parte de mim. Não sou de co-memorar, prefiro brincar e memorar. E também não sou muito fã de geniais, prefiro os puros e insensatos, estes me fazem bem. E sei ser chato, finjo ser poeta, musico e sei lá o que. mas isso é de brincadeira, por diversão. Sou mesmo é esse aí, quase sempre bem-humorado, mas nem sempre sei me fazer entender. esse texto, fiz de brincadeira. Só pra manter o blog atualizado e dizer que postei algo. só isso. E hoje, vai ter jogo do Misto F.C. vou assistir. Não sou fanático por futebol, mas sei lá, não gosto de ficar em casa em dia de aniversário. Agora vem o sentimento de culpa, juro que to morrendo de sono, mas queria deixar algo, que me perdoem os gramáticais, linguistas e bla. Só queria escrever e dizer que amo. Eu disse isso? Que viagem. Pronto, falei demais já. Namastê.

Ontem deitei às seis de triste e cansado
Acordei a pouco, vim e escrevi
tentativa de poetizar mais imperfeita
Ridícula, hoje tudo é ridículo
A prosa, a poesia, o texto
Até o dormir foi ridículo
As seis, era sábado!

Nem titia, titio, primos,
pai e mãe me animaram,
e o telefonema, fiz que não ouvi.
Queria dormir, nada de festa
To cansado, sem paciencia
E festa, pra quê!?
Deu sono de novo,
vou dormir
Pronto, agora sim,
Consegui ser mais ridículo ainda.

Nada de soneto e texto legalzin,
hoje é dia de ser bocó, eu sou bocó!
Queria que conhecem essa parte de mim
Ridículo, sei ser bocó, bobo já nem falo mais.
Só queria dizer que amo.
Sim, eu disse isso.
Hoje é dia de memorar
não quero comemorar,
hoje quero o dia pra mim,
só lembrar de quanto tentei,
em muito fracassei,
mas se precisarem de mim,
meu quase máximo terão,
e de novo,
deu vontade de chorar,
o bom de tudo é que eu amo,
sempre amo.

Sou chato, bocó e amo.
Sempre fui assim,
Ilusão faz parte de mim.

Agora a frase de efeito.
Não tenhais medo, vós valeis mais do que guardais. Ouvindo o Padre repetir
amém!


*Imagem intitulada Agua de beber. Por Nathy Silva

Minha Namorada

Vinicius de Moraes

Composição: Vinicius de Moraes / Carlos Lyra

Se você quer ser minha namorada

Ai que linda namorada

Você poderia ser

Se quiser ser somente minha

Exatamente essa coisinha

Essa coisa toda minha

Que ninguém mais pode ter

Você tem que me fazer

Um juramento

De só ter um pensamento

Ser só minha até morrer

E também de não perder esse jeitinho

De falar devagarinho

Essas histórias de você

E de repente me fazer muito carinho

E chorar bem de mansinho

Sem ninguém saber porque


E se mais do que minha namorada

Você quer ser minha amada

Minha amada, mas amada pra valer

Aquela amada pelo amor predestinada

Sem a qual a vida é nada

Sem a qual se quer morrer

Você tem que vir comigo

Em meu caminho

E talvez o meu caminho

Seja triste pra você

Os seus olhos tem que ser só dos meus olhos

E os seus braços o meu ninho

No silêncio de depois

E você tem de ser a estrela derradeira

Minha amiga e companheira

No infinito de nós dois

O Blues tem rosto

Quantos, ei, pobre homem! Já ouviu?
Caminhou pela noite e sentiu dor...
Chorou pra não falar de seu amor...
Guardou no peito aquilo que sentiu?

Foi com seu, puro, olhar que a flor sorriu
Viu que Ela era música, gesto e odor
Sentou no chão, simples, alma e Calor
Pegou o lápis, som que ninguém ouviu

Foi seu primeiro blues, vinte e seis
Pela estrada, moto e vinho, sua fé
Percorreu o mundo, restou-lhe boa voz

Face, pura dor, fez oitenta e seis
Sua velha guitarra, nobre, de pé
É digno em ser, canto, soul, feroz!

Leandro

Foto retirada de Reconstrucion.

Nostalgia

E os desejos adormecidos,
com um sopro do belo, acordam,
e trazem amores guardados,
da infância, da adolescência,
de algum caminho longo...

Sopro divino, renasce
o que esta no coração
do que somos, e daquilo
que nos construiu

Não são as palavras em si de Hey Jude
que trazem aquelas lembranças
é o som, o simples som daquela musica,
lembra-me Juliana, cloro, piscina...

O significado não importa
o que me toca, arrepia
são os gritos de Eco trazidos
de alguma memória do passado

Pode ser um sino,
o barulho de trem,
é minha avó...
O disco de Belchior
meu tio, cantor, saudoso,
alegre, elegante, no céu...

O jogo de damas, eita vô,
o chá da tarde, feliz, vovó,
a risada feliz, minha tia, Maria...
Sentados no céu, no eterno
de meu coração, na construção
de minha alma...

Que palavras são estas, que cheiros
são estes, gostos, cores, perfumes,
toques e olhares, sons do passado
e o amor, que sendo amor
será eterno, vivo enquanto
sabor, cor, odor, palavra, som, frescor...

Pode ser silêncio, quando se
deita na cama e o vazio é
possuído pela lembrança
do esquecido, a casa
do desejo, que se nutre
pelo símbolo habitante
no cotidiano,
que me possui,
enfim, naquele video,
na voz de Vinicius,
no violão de Toquinho...

BIOÉTICA

*Hoje vou abrir uma execeção, vou postar um artigo sobre Bioética que estava procurando há muito tempo. O autor é do Moderador do Conselho Mundial de Igrejas Dr. Walter Altmann.
Ainda tenho muitas dúvidas e questionamentos sobre o tema. Publico este artigo como ponto de partida para um debate. Torço para que alguém leia, rsrs.


O CUIDADO PELA VIDA

I - Vida – uma visão cristã

1. A fé cristã entende a vida a partir da ação criadora de Deus. Sendo Ele o doador da vida, não é possível reduzi-la a uma propriedade privada. A vida é concessão, é presente, é dom de Deus. Porque criada e nutrida por Deus, a vida tem uma profundidade insondável. Esta profundidade misteriosa da vida não permite que ela seja transformada em coisa ou objeto que se possa manipular, vender ou comprar. O bem da vida é uma graça que recebemos, mas da qual não podemos dispor. Porque é indisponível, a vida não pode ser consumida irresponsavelmente nem pode ser descartada levianamente. A vida é um bem sagrado. O testemunho da Escritura aponta para esta sacralidade da vida e nos convida a assumirmos uma atitude de profundo respeito, pois Deus viu que o que criou era “bom”, “muito bom” (Gn 1.10, 12, 18, 21, 25, 31).

2. Contudo, a bondade da criação não reside no fato dela ser boa em si mesma. A bondade da criação repousa sobre o amor transbordante de Deus. Mesmo depois da queda, Deus continua amando sua criação e a tem sob o seu governo. A prova maior deste amor é o fato de Deus ter enviado o seu Filho Jesus Cristo para a salvação de todas as pessoas e para a redenção do universo.

3. O pecado é a real tragédia do ser humano e de toda a criação, que é marcada pela morte. O pecado rompeu definitivamente a relação entre Deus e o ser humano, entre o ser humano e os outros seres da criação e a relação dos seres humanos entre si. Cada qual se transforma no inimigo do seu semelhante. Contudo, Deus e o mundo não são inimigos. O mundo não é propriedade do diabo, mas permanece sendo a boa criação de Deus, ainda que profundamente marcada pelo pecado.

3.1. De fato, há uma fraternidade na tragédia e na esperança entre todos os seres vivos. Na tragédia, porque a criação como um todo sofre a realidade da morte, que também se mostra na destruição dos seres vivos (Rm 8.20, 22-23). Mas há também uma solidariedade na esperança, porque todos aguardam pela realização do Reino de Deus, que significa a superação da morte e do sofrimento (Rm 8.19, 21, 24-25).

3.2. Entretanto, isso não dispensa o cristão de assumir sua tarefa de ser um bom administrador, cuidando da boa criação de Deus (Gn 2.15). Somos chamados à responsabilidade, ou seja, devemos responder pelos nossos atos diante do Deus vivo e verdadeiro. Muitas pessoas cristãs ficam inquietas com as notícias de que a ciência já dispõe de instrumentos técnicos para viabilizar a clonagem de seres humanos. Isso assusta também a opinião pública e muitos cientistas.

3.3. A Igreja de Jesus Cristo tem o seu compromisso de afirmar a dignidade da vida humana. Falar isso somente é possível na medida em que afirmamos que a vida é um dom de Deus. A visão corrente na mídia - de que somente a qualidade de vida é critério para definir a dignidade da vida - parte do pressuposto de que a ausência de dor e de sofrimento é o critério maior para determinar a dignidade da vida humana. O prazer de viver é o imperativo categórico da sociedade de consumo e o sofrimento é considerado uma condição inaceitável.

II - A ciência e sua relação com a vida

4. Obviamente, não podemos deixar de reconhecer que os avanços científicos nos trouxeram benefícios maravilhosos. Hoje dificilmente alguém precisa morrer de tuberculose ou de lepra ou de outra doença infecto-contagiosa, se descoberta nos seus inícios. As mortes prematuras de crianças não são mais a regra, mas tristes exceções. Devemos isto, entre muitas outras conquistas científicas, aos conhecimentos acumulados pela biologia e pela medicina.

5. No entanto, entendemos que a ciência e seus avanços, como tudo o mais em nossa realidade, também vêm acompanhados de riscos e ameaças à própria vida e sua dignidade. Como em todos os âmbitos, tampouco a ciência poderia pretender estar imune à realidade do pecado. O cientista que faz uma nova descoberta não pode saber de antemão qual o uso que outras pessoas, instituições, empresas e governos farão dele. Freq&uumlentemente a pesquisa e seus resultados são comandados pelo objetivo maior de maximizar lucros empresariais. O próprio conhecimento que pode curar pode também, em muitos casos, matar. A ciência que nos deu a energia elétrica ou mesmo a medicina nuclear também nos deu a bomba atômica. O uso de recursos modernos muitas vezes está também determinado por condições sociais e econômicas, dependendo, por exemplo, de que pode pagar por eles. Além disso, os aparelhos que salvam as pessoas da morte também nos colocam diante de decisões difíceis, como, por exemplo: quem decide se os aparelhos de um paciente na UTI devem ser desligados? Ou, inversamente, quais são os critérios de escolha quanto à pessoa enferma que será conectada a um determinado aparelho, se há mais quatro ou cinco pessoas à espera do mesmo aparelho salvador?

6. Hoje a ciência pode até mesmo alterar as informações genéticas que determinam a vida. Descoberto o caminho, há uma compulsão para trilhá-lo. É isso que se faz, por exemplo, ao produzir medicamentos e vacinas, alterando as informações genéticas de bactérias. A recombinação do código genético é uma ferramenta tecnológica extraordinária que pode modificar a vida humana e a dos demais seres da criação. Por meio da mudança genética, plantas podem ser modificadas para que cresçam mais rapidamente, para que produzam mais, para que sejam resistentes às pragas. O mesmo pode e está sendo aplicado aos animais, principalmente os que nos servem de alimento. Rompe-se, assim, com as limitações e as barreiras das diferenças que há entre as espécies. Os cruzamentos das espécies e dos reinos biológicos são hoje possíveis em laboratório. Benefícios advêm dessas descobertas. Mas quais são os riscos e malefícios? Quais os critérios para discernimento? Quais os instrumentos legais para coibir os abusos? Como direcionar os benefícios da pesquisa e da ciência para o conjunto da população? Enfim, como preservar a dignidade da vida?

III - A vida como mercadoria?

7. Uma certa lógica comercial transformou os seres vivos e o próprio ser humano em objeto, cujo valor é regulado pela oferta e pela procura do mercado. O mercado aliado à ciência (e vice-versa) arroga-se o direito de agir como um deus. Entretanto, o mercado somente existe por causa dos recursos naturais. Sem os recursos naturais não há produtos para compra e venda.

8. No entanto, com freqüência o mercado nos ilude. Ele nos diz que não estamos comprando produtos que vieram de recursos naturais. Induz-nos a pensar que compramos algo que tem vida própria, e que nos oferece a promessa de realização, de felicidade. É precisamente esta idéia de que podemos comprar felicidade ao comprar bens de consumo que é profundamente predatória, destruidora do meio ambiente.

9. A ganância alimenta o nosso coração e o consumo engorda os nossos corpos. É necessário ver que a criação foi colocada por Deus para que ela fosse preservada e que fosse responsavelmente utilizada. A utilização dos recursos naturais deve garantir a vida desta e das futuras gerações para que também estas possam viver de forma digna. A possibilidade de manipulação genética vinculada à exploração comercial de seres vivos, por exemplo, sinaliza para uma relação perversa entre ciência, comércio e criação. Aquelas pessoas que deveriam ser as jardineiras, que cuidam do jardim de Deus, se transformaram em predadoras.

10. É necessário, portanto, despertar a consciência de que aquilo que funciona tecnologicamente e é útil para o mercado não é necessariamente justificável sob a perspectiva da ética cristã. Sem o conhecimento respeitoso da vida, os avanços científicos podem esconder um potencial maléfico muito grande. Os avanços científicos não se constituem em um problema meramente técnico, mas sim, antes de tudo, ético.

11. Assim, o enfoque ético deve ter primazia sobre a capacidade técnica de se realizar pesquisas científicas com as informações que determinam a vida. Temos permitido que a ciência, a tecnologia tome decisões em nosso lugar. Porém, os passos que a ciência quer dar não podem ser justificados ou legitimados pela própria ciência. Somente o julgamento ético dos seres humanos é que pode decidir os rumos da ciência.

IV - A redenção da vida: como a bioética pode nos ajudar?

A – A vida digna: uma perspectiva teológica

12. Numa perspectiva teológica a vida tem uma dignidade inviolável, porque provém de Deus. Assim é necessário recuperar o temor diante da vida. Albert Schweitzer, importante teólogo protestante e médico, tinha a consciência de que todas as formas de vida devem ser vistas sob a perspectiva do temor respeitoso. Sob a ótica evangélica, a vida não é propriedade, como quer o mercado, nem objeto, como pode supor a ciência, mas é dádiva de Deus. Este deve ser o ponto de partida para um agir responsável.

13.A Escritura aponta para a nossa responsabilidade diante de Deus, da criação e do ser humano. É necessário garantir a existência da criação para as gerações futuras. Estamos geneticamente e historicamente ligados. Diante disso, a visão de que Deus ama o mundo na sua totalidade nos dá olhos que enxergam o mundo como o nosso próximo. Não somente o ser humano é nosso próximo, mas também os seres da criação o são. Nos relatos dos Evangelhos, Jesus Cristo, o Filho de Deus, é profundamente sensível para com os seres da criação e em especial para com os seres humanos.

B – Bioética: instrumento em prol da vida

14. A bioética prioriza a proteção da vida. Ela é uma disciplina acadêmica e um movimento da sociedade que propõe discutir as questões éticas em virtude dos avanços da ciência. A bioética não se preocupa somente com as questões médicas, mas com a sobrevivência do planeta e com o futuro da humanidade. Além destas preocupações, a bioética também aborda temas como a fome, a discriminação racial, o combate à violência e o combate à destruição do planeta. Para a igreja cristã, estes temas são muito pertinentes, pois a bioética, bem como a fé cristã, é favorável à vida, o bios. Ambos se preocupam com o agir correto e responsável diante da vida em todas as suas formas.

15. A bioética, a partir de uma visão cristã, entende que somos chamados a viver de modo fraterno com o ambiente que nos rodeia, cuidando da água, das florestas, da preservação do solo. Faz-se necessário afirmar, cada vez mais, que a dignidade do ser humano é um bem do qual a igreja, em sua proclamação e ação, não pode abrir mão. A dignidade da vida humana não é propriedade nem conquista, mas é dádiva de Deus. Diferente da visão utilitarista, o imperativo do momento é viver de modo grato e alegre, satisfeito com aquilo que temos. Inversamente, a ganância ilude-se ao pretender, falsamente, preencher o vazio da existência humana. A ganância também é um motor propulsor do desastre ambiental. Assim, para a bioética, o saber é colocado a serviço e para o resgate da dignidade do ser humano e do ambiente em que vive. Saber-nos acolhidos por Deus nos torna solidários com os seres que Deus colocou ao nosso lado para vivermos em comunhão respeitosa com eles.

V – Encaminhamentos práticos

A - Fatos para pensar

- Há denúncias de pesquisas com seres humanos que causam prejuízos físicos e males emocionais nos países pobres. A ganância e as vaidades produzem cobaias humanas. Estas práticas atentam contra a dignidade humana. Há também denúncias de pessoas que foram abusadas em virtude de procedimentos médicos e hospitalares desrespeitosos e irresponsáveis. Neste rol, incluem-se aquelas pesquisas feitas sem garantias de benefícios físicos e sem o consentimento informado do paciente.

- A possibilidade de reprodução da vida em laboratório rompeu com a história da humanidade de que a procriação somente acontecia na união dos gametas masculino e feminino, por meio da união sexual entre um homem e uma mulher. Agora é possível fecundar o óvulo sem a presença do homem. Muito mais ainda, não há mais necessidade do espermatozóide, pois um óvulo pode ser fecundado por um outro óvulo.

- Não é raro ouvir depoimentos de pais que lançaram mão da reprodução medicamente assistida, dizendo que o objetivo seria a busca de uma certa perfeição física do filho ou a escolha do sexo da criança. Também houve o estranho episódio de um casal de surdos que, por encomenda, tiveram um filho surdo. A escolha desses pais pode ser idificada como busca por satisfazer os seus próprios caprichos. Rompe-se com a prerrogativa do casal de procriar, abrigando a criança na família como uma dádiva confiada ao seu cuidado, mas com dignidade própria. A noção de procriação é substituída pela prática da re-produção, como sendo um processo industrial.

- Muitas plantas e animais brasileiros foram patenteados por empresas de países desenvolvidos. O código genético de tribos indígenas brasileiras também foi patenteado por empresas estrangeiras. As empresas se transformam em proprietárias das linhagens genéticas de pessoas, animais e plantas. Essa é uma prática que se chama de biopirataria. Recentemente, o Brasil conseguiu reaver o direito de comercializar os produtos derivados do cupuaçu, que tinha sido patenteado pela Asahi Foods do Japão.

- Os estudiosos alertam que novas doenças estão sendo definidas ou exageradas por especialistas, muitas vezes financiados pelos próprios laboratórios. Os artigos acusam a indústria da venda de doenças - prática na qual se infla o mercado de uma droga convencendo as pessoas de que elas estão doentes e precisam de tratamento médico. Desse modo, necessidades são despertadas para satisfazer as exigências do mercado. Pior: doenças, que as pessoas não têm, são introjetadas nas suas consciências para alimentar um mercado bilionário. A ganância é uma força poderosa que move a indústria farmacológica.

B – Que pode fazer a Igreja?

Em id desses – e muitos outros – desafios nessa área, que podem e devem fazer as igrejas? Em primeiro lugar, cabe-lhes uma responsabilidade pastoral. Elas deverão acompanhar de maneira solidária as pessoas que porventura tenham sido vítimas de processos que violaram sua dignidade, visando o restabelecimento de sua integridade pessoal. Elas também deverão assistir as pessoas que estão defrontadas com situações que demandam sua decisão ética. Numa ética evangélica não lhe farão simplesmente prescrições de como decidir, mas darão orientação e critérios que auxiliem as pessoas no processo de sua própria tomada de decisão, uma orientação centrada no valor da vida como dádiva de Deus e no caráter inviolável de sua dignidade.

Em segundo lugar, as igrejas deverão informar-se constantemente acerca dos avanços científicos, suas possibilidades e implicações, seus benefícios, mas também seus riscos e, mesmo, suas perversões. O bom conhecimento do assunto é pré-requisito para a formação de juízos e para a proposta de alternativas práticas. As igrejas também procurarão disseminar esse conhecimento e a reflexão teológica acerca dele entre seus membros e comunidades. Também cabe às igrejas promover espaços para que se discutam estas questões com os profissionais da saúde, com políticos e pessoas interessadas. Mais e mais hospitais, por exemplo, estão incluindo nas suas comissões éticas também alguém com formação teológica ou responsável pela capelania hospitalar.

A partir desse conhecimento e desse processo de reflexão as igrejas também farão manifestações na esfera pública, posicionando-se em relação a propostas de ordenamento legal da pesquisa e dos avanços científicos, no que afeta a dignidade da vida, bem como em relação a políticas públicas que visam tornar acessível a toda a população as conquistas científicas. Decisões políticas, baseadas na ética, são essenciais para democratizar o acesso aos benefícios da ciência e coibir os abusos que discriminam contingentes populacionais ou violam a dignidade da vida.

Por fim, há que reconhecer que o alcance das ações das igrejas pode ser limitado – ainda assim, significativo – num processo em curso com sua própria dinâmica e também com poderosos interesses envolvidos. Contudo, há uma crescente consciência na sociedade e entre as nações da necessidade da reflexão ética no que concerne à dignidade da vida. E as igrejas devem estar dispostas a contribuir. Por isso, as igrejas, em todos os níveis, desde o local e comunitário até o global e político, devem acrescentar sua voz, junto às da sociedade civil e de todas as instâncias interessadas e envolvidas, no processo de fortalecimento da bioética.

Porto Alegre, 30 de abril de 2008.


Walter Altmann
Pastor Presidente

http://www.luteranos.com.br/articles/9940/1/Posicionamento-da-IECLB-sobre-bioetica/1.html