Rostos em desfiguração - Selvagem

A polícia apresenta suas armas
Escudos transparentes, cacetetes
Capacetes reluzentes
E a determinação de manter
Em seu lugar
O governo apresenta suas armas
Discurso reticente, novidade inconsistente
E a liberdade cai por terra
Aos pés de um filme de Godard
A cidade apresenta suas armas
Meninos nos sinais, mendigos pelos cantos
E o espanto está nos olhos de quem vê
O grande monstro a se criar
Os negros apresentam suas armas
As costas marcadas, as mãos calejadas
E a esperteza que só tem quem ta
Cansado de apanhar
*Composição : Paralamas do Sucesso

A música Selvagem é bem apropriada para concluir esta reflexão. O título da música já é extremamente apropriado. Aprendemos que ser civilizado é não agredir, não ferir, manter as coisas em ordem. Infelizmente, aprendemos ignorar, ser indiferentes faz parte das regras da civilização. Se me incomodo, simplesmente, “lhe dou as costas”. Da indiferença nascem as exclusões e estigmas, gerando tudo o que é forma de destrato a dignidade humana. Mas nossa distorção em relação ao que é civilizado é gerada pelas formas de se fazer política, esta, antes de tudo é que precisa ser mudada.

Ainda existem aqueles que procurar mostrar o olhar daqueles que são invisíveis na sociedade. O cinema de Godard apresenta como característica mostrar a visão dos que estão à margem da sociedade. Assim como apresenta imagens que não estamos acostumados a ver nos cinemas mais comerciais... A cidade apresenta suas armas. E quando paramos para olhar, de fato, aqueles que estão morando nas calçadas, pedindo nos sinais, nos assustamos, vemos quão selvagem é nossa sociedade. Os negros, seres invisíveis na sociedade americana até a década de 50, 60, começaram a se utilizar de uma estratégia simples, mas ousada, ir onde eram proibidos, anulados. Obrigaram a sociedade a vê-los. Não esconderam seus rostos. Mostraram o absurdo das leis a que eram submetidos, mostraram suas costas marcadas e mãos calejadas...

Que os negros, os meninos de rua, os mendigos, as mulheres, os homossexuais e todos que a sociedade lhes deu as costas possam juntos gritar:

Perto está o que me declara justo:
Quem fará processo contra mim?
Apresentemo-nos juntos!
Quem é meu adversário de processo?
Apareça diante de mim!

3 comentários:

Lorena disse...

Nossa, Leo... Me emocionei demais com a sua reflexão, principalmente com o fechamento dela, o final... às vezes eu me sinto tão inerte perante toda essa hipocrisia e mediocirdade das sociedades atuais, que se viram contra os excluídos, que ignoram a sua presença, porque é mais fácil ignorar que encarar de frente, sempre é... Eu sei que é uma coisa que deve partir de mim, mudar essa situação primeiro dentro de mim mesma, mudar meu coração, pra daí então mudar minhas atitudes. E me deparar com uma reflexão como essa que você fez acaba sendo um impulso, uma farpa que machuca, incomoda, que lateja fazendo lembrar que ela tá ali e precisa ser retirada...

Obrigada por essa reflexão, de verdade. Vc vai ser o grande merecedor de um selo show de Bola que eu ganhei, um tempo atrás. ;)

Tô com saudades. beijo. =*

Éverton Vidal Azevedo disse...

Agora li. Ótimo texto meu amigo! Merece com gosto a caneca que a Lorena te passou. Em breve virei ler a continuaçao.
Abraço.
Inté!

Anônimo disse...

Enfim, consegui ler as 3 reflexões! o/
Gostei de como colocou as idéias, me impressionou.
Eu me pego muito nesse de ignorar, talves por pensar que não posso fazer muito pra mudar a realidade. É aí que me lembro que tenho que existem esses "rostos" e que eles convivem comigo todos os dias. A realidades deles (pelo menos), sei que posso mudar.

Parabéns, me surpreendeu!